sábado, dezembro 09, 2006

agora vai. cortei o cabelo, fiz a barba, e porque não, escovei os dentes.
tô brincando. só cortei as unhas. é bom pra não ficar espremendo cravos-que-inflamam-e-viram-espinhas-contrangedoras-anacrônicas.
o cabelo cortaram por mim (da outra vez que eu mesmo tentei pareci com um mendigo) , agora a barba foi eu que fiz mesmo. isso explica pontilhos de sangue, fazia tempo que eu não treinava.
barba-cabelo-bigode. fala isso três vezes e mentaliza um desejo.
barba-cabelo-bigode-barba-cabelo-bigode-barba-cabelo-bigode: plim! pra mim? obrigado, não precisava. te amo deus. opa, Deus, perdão. é assim que se deve falar com Ele. ou, se me permitem a capciosidade, Ela?
puff! um braço a menos.
definitivamente Ele não tem o menor senso de humor e ainda por cima é rancoroso.
eu entendo, todo órfão é assim. ou filho único. mimado, não aguenta brincadeira. vai lá então bater bola sozinho na parede.
daí me perguntaram: mas porquê a mudança radical? preciso arranjar um emprego, uma namorada e regastar toda minha dignidade social, para que as pessoas voltem a me dar bom dia no hall de espera do elevador. ou que pelo menos comentem sobre o tempo.
olha, tá quente, e não é culpa minha, juro. nem tenho carro, não fumo, não poluo e não voto no bush. então, se enquanto estamos indo do décimo pro tê você queira comentar alguma coisa comigo, sou todo ouvidos pra ahãss, pois és, é-é-mesmoss.
só por isso? não, tem mais a ver com dinheiro e mulher mesmo. assim não dá? dá dá não dá, mas fazendo bico vai dando né.
aí ele me perguntou: mas porque você é zuado assim? quer dizer, o que aconteceram com seus dentes da frente?
pois é, rapaz, foi um incidente numa festa com muitas long-neks e nenhum abridor de garrafa.
era só abrir com a mão. põe um pano e gira.
não sabia dessas modernidades...[momento pensativo] isso explica porque mesmo sem som a festa tava tão animada;
aí ele me perguntou: mas porque você é zuado assim? quer dizer, o que aconteceram com seus dentes da frente?
pois é, rapaz, foi um incidente envolvendo uma par de seios comprometidos com um orangotango com um par de neurônios, nada modernos diga-se de passagem. um era possessivo e outro era machista. daí já viu né...
aí ele me perguntou: mas porque você é zuado assim? quer dizer, o que aconteceram com seus dentes da frente?
guardo no bolso. no almoço só uso os de trás mesmo. menos coisa pra limpar depois né?
eu gosto de ficar passando a língua na gengiva, como se eu estivesse sexualmente provocando alguém. às vezes eu chupo um dente como se estivesse palitando sabe? chuap, chuap, faz o barulinho da língua-saliva-dente.

cortei o cabelo, fiz a barba. cortei o açúcar, fiz dez abdominais.
cortei o cabelo, fiz a barba, troquei meu Bukowsky por outra Pessoa.
outra pessoa sou eu. solidariedade é meu sobrenome: fiz o bulso da minha vó por gentileza, tirei o pulso da minha vó por gentileza, apresentei minha vó pro gentileza e disse: vó esse é aquele doido que escrevia aquelas parábolas bíblicas promovendo o nascimento de um novo homem enquanto assassinava o português. como a senhora pode ver, ele já está morto, e se você não colocar meu nome (completo dessa vez, e não vale apelidos constrangedores de infância) no teu testamento, provavelmente ficarei pobre, cabeludo, sujismundo, e viverei de profecias malucas escritas em viadutos de uma grande cidade.

já estou preparado pra próxima festa: cortei o cabelo, fiz a barba, passei bicarbonato de sódio nos dentes (agora globais), e decorei umas dez músicas do Chico caso apareça uma rodinha de violão e belas-cultas-sensíveis garotas. claro que eu não esqueci da camisinha, pra não repetir meu pai, e dessa vez tenho um abridor de garrafa no bolso. e também estou levando um sachê de maionese caso tenha dificuldades. droga, pensei que tinha parado com Bucowsky. então vou penhorar meu canivete suíço, minha castanhola espanhola e minha cafeteira italiana.
vou comprar um gravata azul. piu bella. combina com o vulcabrás que eu herdei do meu vô.
daí é só cortar o cabelo, fazer a barba e decorar aquela parte, do Hoje eu tenho apenas uma pedra no meu peitoExijo respeito, não sou mais um sonhadorChego a mudar de calçadaQuandoaparece uma florE dou risada do grande amorMentira.
tudo isso num sol sustenido, sob a lua num sereno be-mol.

larguei a rodoviária e a vida de cafajeste. não como mais frango com a mão.
fiz o bigode, guardei o ray-ban, e de camiseta ninguém mais vê meu colar dourado de SãoJorge.
e nem aquela tatuagem amor-só-de-mãe que eu fiz com uma bic quando passei pela cadeia.
aí ele me perguntou: mas porque você é zuado assim? quer dizer, o que aconteceram com seus dentes da frente?
pois é, rapaz, foi um incidente envolvendo jogo-do-bicho, cadeia, uma tatuagem amor-só-de-mãe, e um delinqüente pensamento alto: só se for a tua.

ainda dói pra sentar.

Um comentário:

Anônimo disse...

daí já viu déjà vu né...