quarta-feira, dezembro 06, 2006

Ipanema: projeto de vida

outro título seria: meu reino, meu reino por um caladril.
se você não é branquelo jamais entenderá (nada contra, sou corinthiano, não faço piada racista).
é que nós, ilustres netos de europeus civilizados, herdeiros da cultura clássica grega, e que vieram com uma mão na frente e outra atrás fugindo da fome para o Brasil (com piolho e muita cárie), não podemos, nas praias e lugares a céu aberto, travar um diálogo muito duradouro com o Rei Sol. tive a pachorra de tirar sarro dos gringos em Ipanema, que davam um show de branquelice em mim, torrando num Sol de dar dó. foi suficiente: fui dar um pulo n'água e me exibir pras cariocas que agora só consigo dormir de barriga pra cima, bezuntado de hidratante. até sorrir dói!

nas minhas visitas ao samba carioca, legítimo (porque nenhum foi na Zona Sul), percebi a diferença entre cultura popular carioca e balada de classe média paulistana. e percebi que calor somado à pressão atmosférica ao nível do mar me dá um leseira, uma preguiça, uma vontade de dormir, que de fato, seria impossível pra qualquer ser humano naquela terra manter o mínimo de compromisso com o Deus-Trabalho. talvez isso também explique o povo baiano.

desempregado é quadro. desocupado é aquela função ridícula que a gente faz quando 'trabalha'. eu prefiro o termo 'não é que eu não trabalho, é que eu prefiro fazer uma coisa mais útil pra mim mesmo'. um empenho narcísico. mas cult: ver filmes, exposições, ler livros, ver tua família, ver a luz do dia, evitar tendinites e faniquitos de pessoas que não gostam dessas atividades que eu citei acima.

após largar essa vida de estagiotário, pensei sobre minhas atitudes e fiz uma auto-crítica, numa segunda-feira, lá pelas duas da tarde, deitado, embaixo de um guarda-sol em Ipanema.
daí tive a uma idéia pra ajudar nossa humanidade-xaropeta. é o que eu chamo de Ipanema:projeto de vida.
no meu próximo governo eu juro uma Ipanema em todas as cidades com mais de quinhentos mil habitantes, para melhorar a sociabilidade e lembrar que a vida é boa, e trazer alegriapra alma-amarela-de-crachá.
e o que eu mais gosto mais de Ipanema nem são aqueles gringos irremediáveis, que acham que só porque a meia tem comprimento até a metade canela, significa que ela tem que estar erguida até a metade da canela, e nem é a água (que sempre que eu vou está absurdamente gelada), e nem tanto as cariocas de biquini (tenho uma tese que explica as cariocas não gostarem de paulissstas), mas é a paz de espírito pra ficar deitado dormindo, sem pensar em nada, só soltando grunidos de 'não, brigado' para os ambulantes-constantes injustiçados pelo neo-liberalismo.
eu também gosto bastante do Leblon, como bairro em geral, pena que tudo tem preços orbitantes. mas antes que isso vire novela da Globo, só queria deixar claro, que sim, existe vida pós-trânsito-enchente-patrão-vidinha-de-ser-um-número-na-catraca-e-pagar-impostos.

existe um povo, que anda sem camisa até no metrô e mija em qualquer canto.
um povo que não gosta de placa de rua, solta tiros à noite, e faz um samba-de-roda à cada esquina.
um povo que trabalha também, mas não acha isso o sentido da vida.
um povo negro pra ca-ra-lê-o, pra lembrar que a faculdade ainda é lugar da elite branca.
(engraçado se sentir elite, quando você não faz idéia da onde vai tirar dinheiro pra cobrir tua conta depois do último fim-de-semana)
esse é o povo carioca: uma mistura engraçada de um certo provincianismo numa cidade grande, com um jeitão brasileirão, que no meu ingênuo otimismo juvenil, vejo como uma digna resistência cultural, de legítima nacionalidade, de forma a evitar uma pasteurização do seres humanos naquele babaquinha ocidental que exerce sua cidadania fazendo compras e se distraindo com acessórios coloridos pro seu novo-carro-velho.

vocês perceberam que agora que minha fonte de renda bruta foi 'dispensada' eu meto o pau em quem tem dinheiro. isso se chama, num bom português, de inveja.
mas como eu sou aquele que nem estuda Ciêcias Sociais mas vai fazer um estudo antropológico no Rio de Janeiro em plena 'segunda-feira ao sol', acho que não é minha vez de ter inveja. hihihihi.

e agora uma clamação-de-desabafo:
me amem e eu vos amarei.
me odeiem e ignorarei-vos até voltarem a me amar.
me liguem, me chamem pra sair, passem caladril nas minhas costas.

beijo-tchau.

PS: no Samba do Trem (que lá eles chamam de Pagode no Trem) conheci o Nelson Sargento, lenda da Portela. vou contar pros meus filhos. mas antes vou baixar alguns cd's deles na internet só pra saber o que ele canta e porque é uma lenda. isso se chama ignorância-paulisssta.

3 comentários:

Anônimo disse...

adorei!

Anônimo disse...

nao, isso se chama ignorância sua.

Anônimo disse...

Pensamentozinho saudosista de atmosferas pré-fabricadas. De paulistinha com invejinha de quem tem um lindo mar de paisagem na janela de casa.
Um jorge ben de trilha para sua pseudo cronica seria ideal. (Talvez País Tropical - nada mais clichê)
Desça pra terra um pouquinho anjinho. Tudo poderia ser assim.
Deixe de tanto otimimo-nacionalista-ufanista-prafrentex.
Tem muita poesia na sua realidade. Poesia nem um pouco concreta! Sacou o trocadalho.
Mas no final, acabo gostando.Acho que sou eu que tenho invejinha. Queria eu contar minhas peripécias durante uma segunda feira no Rio (belíssimo)